Poema de Myrtes Mathias
Eu sou Léia,
a pretendida, não cortejada,
não amada
como minha irmã.
Assim
pensava
até o
dia em que o Senhor meu pranto contemplou,
minhas lágrimas
no silêncio conheceu,
um filho
me deu.
Em relação
ao amor, nada aconteceu
que pudesse
ser notado na rotina
de minha
vida.
Mas
aqui dentro do coração, se fez a luz
e o que
então me parecia cruz,
transformou-se
num singular jogo de amor,
como um
segredo que me faz sorrir
e cantar
baixinho, quase num murmúrio,
mas tão
doce que se algum ouvido estranho o escutar,
pensará:
lá está
Léia, a mal-amada,
embalando
o filho, com o seu eterno canto de ninar.
Porque, de repente, Deus-Que-Vê
dá-me
um novo ponto de vista
uma nova dimensão das circunstancias, da situação,
do meu próprio
destino
por que
hei de andar chorando, com medo do que
possa
acontecer?
com medo
de ser comparada e perder,
cheia
de ciúme e frustração?
Por que
não aproveitar os momentos
em que
comigo está o pai de meus filhos?
Este homem
tão cheio de fraquezas
que vai
ser transformado num pai de multidões?
Nesse grande
destino que lhe está prometido,
sou
parceira, principal, mãe de seus filhos,
que lhe
darão netos, bisnetos,
mil gerações,
que atravessarão a História,
com a
mais linda história de amor de Deus.
Este
Deus que hoje me visita, me ilumina,
renova
meu entendimento,
transformando
todo ressentimento num hino de amor,
não de conformação,
mas de aceitação com alegria
do quinhão
que a vida reservou pra mim.
Quando
Jacó chegar, talvez nem possa notar,
mas de
meus olhos sem brilho,
uma
nova luz há de jorrar.
Luz que
vem aqui de dentro, como uma fonte
de amor
e gratidão,
pelo
meu quinhão,
pelo
meu quinhão:
não tão
amada, mas a primeira,
não procurada,
mas a verdadeira,
porque
o Senhor, que vê, e “tem misericórdia
de quem
quer ter misericórdia”,
se apiedou
de mim, alegrou minha alma,
me faz
cantar assim.
Dentro
da limitação que me é imposta,
serei
livre e espontânea no meu amor.
Não procurei
em outro lugar consolo
não dividirei
com outros o meu segredo.
Pensem
de mim o que quiserem, falem o que lhes aprouver,
sintam
até pena de mim:
não sabem
que eu sou feliz, muito feliz.
Engrandecido
seja o nome do Senhor,
que coloca
em meu coração tal espécie de amor,
que se
externa em mansidão, bondade, brandura,
simpatia,
compreensão:
- Olha
para mim, Jacó,
só há
amor dentro de mim e uma eterna gratidão.
Tudo mais
foi esquecido:
és meu
marido, deste-me filhos,
sou mãe
em Israel.
Um dia, os que de nós procederam hão de herdar
a terra prometida que mana leite e mel.
E nisso há um doce envolvimento,
um companheirismo que ninguém pode desfazer,
uma cumplicidade santa, que me encanta e me faz cantar.
E me faz livre para deixar livre o amor sempre escondido,
com medo de ser rejeitada e me machucar.
Mas em mim, agora, há o Espírito de Deus,
e “onde há o Espírito, há liberdade”.
Coloco nas mãos de Deus o meu agora.
Passa por Suas mãos o meu amor
e Ele o santifica, o faz lindo.
Me faz linda. Que o mesmo aconteça diante de ti.
Foi-se o temor. Aleluia!
Viverei intensamente cada instante de proximidade.
Não tenho mais medo de ser envolvida, de me envolver.
Nas mãos do Senhor está o meu destino, minha vida.
Coube-me este quinhão:
embalar teus filhos, cuidar deles,
são minha riqueza, minha herança, minha companhia.
Se não fosse por ti não poderia,
escrever essa canção, sentir esta alegria.
Não tenhas remorso, não sintas medo, não desvies o olhar.
Sou feliz. Sou agradecida.
Participo da vida, como vencedora.
Deus atentou para mim. Abriu-se o entendimento,
mostrou-me o quanto sou abençoada:
nunca mais deixarei que me julguem mal-amada.
Cessou o pranto. Sou rica, sou feliz e canto,
enquanto espero e descanso no Senhor.
Este é o meu hoje, o meu agora.
O que virá depois, hora após hora,
está nas mãos de Deus, o Senhor que cuida de mim.
Cuida de nós.
Amém!